27 março 2011

Idade Precária

Precariedade. No trabalho, na habitação, no estilo de vida, e cada vez mais na sobrevivência. É o que a cada vez mais está reduzida a sociedade portuguesa. Se os jovens vêem o seu futuro empenhado pelas jogadas e estratégias gananciosas do capitalismo selvagem, cada vez mais neo-liberal, a geração depois dos 40 não fica atrás na angústia da incerteza e na marginalidade laboral, refém da dicotomia de: demasiada velha para o mercado do trabalho, demasiada nova para a reforma. A precariedade é todo um sistema que é estudadamente perverso. E tremendamente perverso, com vista à escravidão pura e simples. Com trabalho cada vez menos remunerado e com cada vez menores apoios sociais.


O Governo estimula o desemprego, com a legislação laboral que aprovou nos últimos anos, nomeadamente o Código do Trabalho, habilmente aproveitado pelos capitalistas para atacarem violentamente os trabalhadores, em particular os mais velhos. Com a legislação que permitiu o crescimento do trabalho temporário e dos falsos recibos verdes, onde quem fica com a mais-valia do trabalho se escamoteia às suas obrigações sociais. O discurso oficial do poder estatal afirma a falência a prazo da Segurança Social. Mas cada vez menos fala das dívidas empresariais. Das dívidas às claras e das mascaradas que o próprio Estado usa e abusa. O silêncio das dívidas à Segurança Social, não só dos pequenos empresários, já tão precários como os próprios trabalhadores, mas, e sobretudo das dívidas mascaradas, verdadeiramente criminosas, dos grandes grupos económicos, com a estratégia dos falsos recibos verdes. Dos grandes grupos económicos que, paradoxalmente num país em profunda crise económica e financeira, continuam a apresentar lucros de milhões e em crescimento: a banca, as seguradoras, as grandes superfícies de vendas e, mesmo, (porque haverá medo em o dizer?) os grandes grupos de media (Global Notícias, Cofina, Lusomundo, etc).

Ao fim de 20, 30, 35 anos de trabalho, toda uma vida, o trabalhador da geração dos 50 anos, mesmo que, até então, quadro de uma empresa, é posto pura e simplesmente na rua, para ser substituído por um estagiário não renumerado ou um trabalhador temporário ou a falso recibo verde, a quem a empresa só pagará uma parte (chegando a menos de metade) do que pagava ao trabalhador fixo pela execução do mesmo trabalho. Para quem é posto na rua, é toda uma vida que se desmorona para não se reconstruir mais. Porque, devido à idade, não voltará mais a ser admitido no mundo laboral, apenas lhe restando os biscates do trabalho clandestino. E contudo, continua sobre ele a pressão dos compromissos, nomeadamente de habitação, naturalmente assumidos numa época em que se acreditava na estabilidade.

É a precaridade aos 50, com a auto-estima derrotada, abrindo a porta a casos graves de depressão profunda, com a ameaça de ir viver para a rua, sem saber como chegar ao fim do mês. A geração dos 50, mais do que uma geração à rasca, é uma geração de risco. De alto-risco. E no ar fica a amargura da velha piada: "Nem me importo de trabalhar até aos 70, mas pelo menos, agora aos 50, dêem-me trabalho"...

João Falcão-Machado

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