01 abril 2011

Precariedade de género

Dar uma opinião sobre a relação entre a precariedade laboral e a questão LGBT (Lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros) pode parecer, à partida, que tais temáticas não se cruzam ou que são campos distintos de um movimento social.

Um ponto de vista não tão raro assim, quer dentro dos próprios movimentos trabalhistas – com a justificação que são “micro-causas” que fracturam a luta dos trabalhadores –, quer por alguns movimentos LGBT, que entendem que a sua participação numa parada de precários está fora do seu âmbito de trabalho restrito (que é género, identidade de género e orientação sexual).



Normalmente, a precariedade laboral é designada como um fenómeno que sugere a ideia exclusiva de emprego transitório, instável e inseguro, bem como de trabalho desqualificado e mal remunerado. Esta designação, engloba tod@s @s trabalhador@s, inclusive @s trabalhador@s LGBT dispers@s pelos inúmeros ramos de actividade económica e social. Ou seja, à luz desta designação, @s trabalhador@s LGBT sofrem a mesma precariedade que quaisquer outr@s trabalhador@s e não se justificaria a sua presença, enquanto tal, numa parada de precári@s – afinal seriamos tod@s trabalhador@s e, como tal, a grande maioria igual e uniforme.

No entanto, a precariedade laboral esconde outro rosto: o das descriminações – exactamente a mascara que o bloco central do capitalismo e do patriarcado pretendem ocultar, para poderem continuar a alimentar-se das auto-exclusões entre @s própri@s trabalhador@s, geradoras de mais e mais precariedade.

O ambiente social trabalhista em que nos encontramos pode servir como reforço das exclusões, onde @s trabalhador@s LGBT são descriminados exactamente por questões de género, identidade de género e/ou orientação sexual. Alguns direitos que foram conquistados para pessoas LGBT são mediatizados como progressistas e usados normalmente para ocultar que as mesmas continuam numa situação de fragilidade social, que se reflecte no ambiente de trabalho:

- Vejamos as pessoas transexuais que, apesar dos recentes avanços legais, continuam aos olhos da lei a sofrer uma patologia, que as conduz a um período de dois anos de acompanhamento médico para iniciar o processo de alteração do sexo e nome nos seus documentos;

- Vejamos as famílias das pessoas LGBT, que não podem usufruir da protecção social fruto do seu trabalho, porque o estado não lhes reconhece as situações de homoparentalidade existentes.

- Vejamos a homofobia e transfobia que continua patente na sociedade, reflectindo-se nas relações laborais desenvolvidas em ambiente de trabalho, normalmente num conflito fechado de discussões, onde a vítima não tem condições de suporte e de apoio.

Porque ter mais direitos não corresponde a ter os mesmos direitos, e termos os mesmos direitos não significa termos todos os direitos, ou as mesmas oportunidades, estas situações de múltipla precariedade laboral arrastam-se num sistema capitalista, gerido sobre a desorientação da crise, com o intuito de criar uma competitividade negativa entre trabalhador@s, que pretende criar fracturas, quer seja por questões geracionais, qualificações, diferenças individuais e/ou culturais.

A luta d@s trabalhador@s LGBT não pode existir deste modo se não estiver contra toda a violência perversa existente no seu quotidiano de trabalho, que atenta contra a sua personalidade, dignidade, ou integridade física. A luta d@s trabalhador@s LGBT é a luta contra todas as humilhações indirectas, que ofendem a sua dignidade, e violam os seus direitos fundamentais.

As pessoas LGBT, somam precariedade e descriminação, suportando a selvajaria neoliberal, como trabalhador@s e como mulheres, lésbicas, emigrantes, transexuais e transgénero. E a orientação sexual e identidade de género é ainda um factor transversal que partilham com o resto d@s trabalhador@s, onde uma emancipação queer não pode ficar de fora em qualquer luta contra a exploração laboral.

Por tudo isto, mas também porque as pessoas LGBT são discriminadas nos seus trabalhos por não se enquadrarem em normas familiares definidas pelo patriarcado, pela família nuclear heterossexista, por afectos e sexualidades diferentes das “estabelecidas”, ou por não se enquadrarem numa identidade de género baseada numa dicotomia do masculino e do feminino. Torna-se importante a presença afirmativa de um bloco LGBT no 1.º de Maio no Largo de Camões, integrando a parada do Mayday, ou em todas as lutas pelos direitos humanos fundamentais. Vem lutar contra a precariedade, vem lutar pela igualdade sem ambiguidades, nem hierarquia de prioridades, porque “se todos os precários do mundo baterem o pé – ele treme”.

Fernando André Rosa / Panteras Rosa – Frente de combate à LesGayBitransfobia

1 comentário:

Gica disse...

Estou com o Fernando :D